Yoga Vasishtha: Sexta Conversa

Disse o príncipe Rama:

“Venerável Senhor, tu conheces os mistérios de todas as coisas. Uma grande dúvida cresce no meu coração como uma onda no mar. Como pode, Senhor, aderir-se a impureza à mente, que está localizada na pureza eterna do Espírito infinito, Brahman, não limitado pele tempo nem espaço?

Além disso, se não há —nem tem havido nem haverá jamais— outra coisa que a Entidade Espiritual, como e de onde surgiu n´Ele semelhante impureza?”

Respondeu Vasishtha:

“Bem dito, bem amado Príncipe!

Observo que a tua compreensão se aproxima da via da libertação e colhe o perfume das flores que se abrem no jardim do paraíso. Contudo, ainda não é o momento apropriado para tu fazeres essa pergunta. Poderás fazê-la quando eu chegue à conclusão do tema. É preferível examinar a mente com cuidado, apercebendo-se da natureza dos seus actos e operações, que contribuem para provocar os renovados nascimentos dos humanos.

A mente deleita-se com pensamentos sobre os objectos desejados; então, assimilando a natureza destes, assume a mesma forma do que lhe proporciona o seu prazer. Já que o corpo está submetido à mente, molda-se na forma desta, exactamente da mesma forma que o vento se embalsama com o perfume dos maciços de flores sobre os que sopra.

Os sentidos interiores, uma vez estimulados, animam os órgãos exteriores dos sentidos segundo as suas modalidades. Seja qual for a natureza que pelas suas disposições adopte a mente, fica reflectida na forma das suas duas actividades: a vontade e a acção.

Os Sábios do sagrado Yoga Adhayatma reconhecem que a mente, na sua essência, é Brahman, e recomendam a paz e o domínio de si mesmo como únicos meios de alcançar a libertação.

Discípulo bem amado (Rama tocou os pés do bem aventurado Sábio como sinal de grandíssima veneração), entende que a mente é a fonte de todas as regras e métodos como o mar é a origem de toda a pérola escondida em seu seio.

Assim os discípulos amados de seu guru que desejem gozar da felicidade sem misturar o seu espírito devem habituar a sua mente a permanecer nesse estado de felicidade. A mente que tenha escapado da esfera do mundo fenoménico estará livre de todo o prazer e de todo o sofrimento, como o passarinho que sai voando pelos ares após romper o ovo e deixar o solo terrestre.

Oh inocente Rama, não mantenhas inclinação alguma para com o mundo fenoménico. É ilusão sem realidade, está repleto de temores e tendências más e desdobra-se para seduzir a mente distraída. Os sábios chamaram cenário mágico (maya) à nossa consciência do mundo, designando-a como aparição de ignorância, simples ideia e causa e efeito das nossas acções.

Entende que é a mente enganadora quem desenvolve o mundo visível perante ti; desembaraça-te dela, pois.

A meditação concentrada do yogui contemplativo e consagrado ao santo Yoga é o que atenua as impressões de fora e, ao dissociar a mente de todas as coisas exteriores, mantêm a estabilidade e a paz. Então a mente não presta atenção às suas reflexões interiores ou exteriores; fica insensível tanto ao prazer como ao sofrimento e experimenta em si mesma o deleite da unidade.

A mente submetida a incessantes desejos parece-se com o claro firmamento obscurecido por nuvens; uma mente assim, oh Rama, sofre como um morcego cego pela luz do dia, até que desprendendo-se das suas falsas invenções alcança o conhecimento do verdadeiro Deus e da felicidade sem fim.

Da mesma forma que ao libertar-se do imaginário temor de um tigre na selva se reencontra o repouso interior, aprofundando a tua busca, descobrirás que não existe cativeiro no mundo: as noções “esse é o mundo” e “este sou eu” não são mais que erros da mente.

Os caprichos assaltam-nos e depois afastam-se, tomando formas diversas, da mesma maneira que as nossas mulheres desempenham o papel de esposas durante a nossa juventude e o de enfermeiras na nossa velhice.

Quem tiver uma mente inclinada a saborear os prazeres da carne deveria começar por reprimir essas propensões da mesma forma como se arrancam da terra as plantas venenosas.

O homem nobre e sábio que quiser vencer os seus adversários deverá, em primeiro lugar, esforçar-se em submeter os inimigos interiores do seu próprio coração e de sua própria mente, assim como o seu corpo e seus membros.

Os homens mais afortunados são aqueles que têm a valentia de dominar a sua mente em lugar de submeter-se a ela. Eu reverencio esses homens puros e santos que amestraram a grande e perversa serpente da sua mente enrolada no fundo do seu coração; eles são quem repousa na paz interior e na serenidade do seu espírito.

Os reis da terra, com os seus capitais materiais, não são tão felizes como os senhores das cidades do seu próprio corpo e os mestres da sua própria mente.

O homem está à mercê das dificuldades deste mundo lúgubre e obscuro como um pássaro caído nas águas do mar. Portanto, oh Rama, como se fosse um búfalo, saca com o teu próprio esforço a tua mente fora do charco ilusório do mundo.

O homem com uma mente não inquietada pela sucessão de alegrias e penas mundanas nem pelas vicissitudes da doença e da morte já não é um ser humano, é como um yaksha.

Nem o mundo é teu nem tu és deste mundo; não confundas o falso com o certo. Nunca alimentes na tua mente a ideia falaz de que serás dono de grandes bens e de coisas agradáveis, porque tu, como essas cosas, existes para o deleite do Criador supremo e Dono de todo.

A menos de que o bem de todos não se converta em teu próprio bem, oh Rama, não farás mais que adicionar travas aos teus pés. Inclusive o bem do teu Império é ilusão se é exclusivo e está separado do bem de todos os seres.

Adora o Sempre Misericordioso, o infinito Amor, como se se trata-se da tua própria mente, e permanece na paz dando paz a todos.”

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