Yoga Vasishtha: Sétima Conversa

Disse o príncipe Rama:

“Diz-me agora, Senhor, como pode conseguir a libertação um ignorante ou um preguiçoso, um débil que nunca tenha frequentado a companhia de yoguis nem tenha recebido nenhuma instrução Espiritual.”

Respondeu Vasishtha:

“Oh Rama, o ignorante que nunca tenha alcançado nenhum dos graus de Yoga é arrastado pela corrente da reencarnação através de centenas de nascimentos, até que num nascimento ou outro tenha ocasião de adquirir a luz Espiritual. Pode ocorrer também que, o convívio com santos, chegue a sentir-se insatisfeito com o mundo e que isso o conduza a um grau de Yoga.

Oh Rama-ji, destrói a sensualidade! Esse é o primeiro grau. Porquê utilizar muitas palavras quando se pode expressar com poucas?

O desejo é a nossa principal escravidão, e a sua ausência a nossa completa libertação.

Quem possuir um sentido tenaz de egoísmo jamais se liberta dos sofrimentos da vida; é a negação desse sentimento o que proporciona a libertação. Quem está atado aos prazeres pensa que a beatitude do nirvana não é nada; preferem a mundanalidade à felicidade definitiva que outros tenham realizado, e quem assim se comporta é declarado homem activo e enérgico.

Semelhante homem mundano parece-se com uma tartaruga, que recolhendo a cabeça sob a sua carapaça, a saca às vezes para beber a água salgada do mar donde habita; permanecendo na mesma condição até que consiga, após muitos nascimentos, uma vida melhor, orientada para a sua salvação.Mas quem reflecte sobre o nada do mundo e sobre a mísera posição que nele ocupa não permite que a corrente das actividades que dia-após-dia exerceu o arraste agora.

Quando um homem começa a pensar de que maneira poderia subtrair-se das paixões e atravessar o tumultuoso oceano do mundo é como se recupera-se os seus sentidos.

Quem despreza as fátuas distracções e as medíocres actividades dos homens, quem se entrega a actos meritórios ao invés de insistir nos defeitos e imperfeições alheias, quem compromete a sua mente em actividades úteis sem causar prejuízo a ninguém e se mostra indiferente perante todo o prazer e gozo corporal, quem mantém conversas amistosas e compassivas e pronuncia as palavras oportunas no lugar adequado, de um homem assim se diz que está no primeiro estágio de Yoga. Para ele é um dever buscar a sociedade dos bons e moldar nela pensamentos, palavras e actos. Ele acostuma-se a livros sobre a filosofia divina e estuda-os com diligência; medita no seu conteúdo e retém as doutrinas que têm o poder de salvá-lo do mundo depravado.

Chega então ao segundo estágio de Yoga, chamado estado da busca.

Escuta dos lábios dos pandits tradicionais a explicação dos Shrutis e dos Smritis, as regras de boa conduta e os métodos de meditação e de prática de Yoga.

Desapega-se do seu aspecto exterior de orgulho e de vaidade, assim como da sua inveja e da sua avareza, da mesma forma que uma serpente se despoja da sua antiga pele. Tendo purificado assim a sua mente, dedica-se com devoção ao serviço dos instrutores Espirituais e dos santos que lhe desvendam os mistérios da filosofia do Yoga.

Acede então ao terceiro estágio. Aprende a estabelecer a sua mente com perseverança conforme os ensinamento de Yoga, e consagra o seu tempo a conversas sobre temas Espirituais e a boas acções para com os demais.

O homem dotado de sabedoria que tenha chegado até este terceiro estágio permanece num estado de consciência independente tanto da objectividade como da subjectividade. Libertou-se do sentimento de ser, seja como sujeito ou seja como objecto dos seus actos. Sabe que toda a união acaba em desunião e toda a ganância terrena será perdida; graças a essa convicção e à prática contínua de meditação e da virtude chega com certeza a conhecer Deus dentro de si com a clareza com que se vê um fruto na palma da mão.

O conhecimento do Autor supremo da Criação penetra-o da segura convicção de não ser “eu”, senão Deus, quem faz tudo no mundo. Tendo renunciado ao seu sentido de individualidade, um homem assim já não está apegado a nada no mundo. O contentamento é um agradável perfume na mente e os actos virtuosos são tão belos como pétalas de rosa. A flor do discernimento interior abre-se como um botão de lótus sob os efeitos dos raios de sol da razão e produz um fruto de santidade no jardim do terceiro estágio da prática de Yoga. O cumprimento, inclusive parcial, destes graus de Yoga Adhyatma é suficiente para anular o mau karma do passado. A estes três estágios, oh Rama-ji, chamam-se em conjunto estado desperto, porque o yogui conserva nele a percepção das diferenças entre as coisas.

Um yogui assim merece veneração; unicamente realiza acções justas; ele cumpre com constância os seus deveres sociais.

Quem consagrou a sua mente ao Yoga com zelo total e inquebrantável e vê todas as coisas numa mesma luz considera-se que tenha alcançado o quarto estágio de Yoga. Quando o erro da dualidade se tenha desvanecido e o conhecimento da unidade interior brilha com resplendor soberano, o yogui encontra-se nesse quarto estágio, e observa o mundo como uma visão do seu sonho.

O quinto estágio é um grau de imensa felicidade, que não é outra que a felicidade da visão de Deus em todas as partes, oh Rama-ji. O yogui eleva-se acima disso e, descendendo através da sua mente às regiões inferiores — um grande sacrifício sem dúvida!— serve nos demais ao seu próprio Si mesmo.

O sexto é o estágio da libertação em vida, oh Rama-ji, no qual ambas, unidade e dualidade, desaparecem. Quem o alcança submerge-se no êxtase divino dentro e fora de si e encontra-se na posse de poderes superiores; contudo, parece humilde à primeira vista.

O sétimo estágio é impossível de descrever com palavras e supera os limites da terra e do céu. Dele diz-se que é parecido ao estado de Shiva e Brahma.”

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