Yoga Vasishtha: Quinta Conversa

Disse o bem aventurado Vasishtha:

“O egoísmo é a raiz das formas de sofrimento mais extensas pelos bosques deste mundo, cujas árvores produzem as envenenadas flores dos desejos. Portanto, oh Rama, esforça-te com diligência em fazer desaparecer do teu coração o sentido de egoísmo e busca a felicidade comprovando em cada momento o nada do teu pequeno tu.

O erro do egoísmo é comparável a uma nuvem escura: esconde nas suas trevas o brilhante disco da lua da verdade e oculta da nossa vista os seus raios luminosos. A errónea impressão de realidade do mundo não pode apagar-se sem o conhecimento da sua irrealidade, conhecimento que procede dos Shastras e dos lábios vivos de um Instrutor.

Aquele que prega a irrealidade do mundo e a realidade de Brahman é levado em brincadeira pelo ignorante, que o vê como um louco. O sábio e o ignorante não podem estar de acordo sobre este tema, como não podem entender-se os bêbados com a gente sóbria.

O homem inteligente, que crê que o Espírito supremo e sempre sereno de Brahman penetra o universo, não pode ser desviado da sua sólida convicção.

Os ignorantes desconhecem a noção de Espírito: crêem que a Matéria é a causa e o efeito da sua própria produção. Mas o homem dotado de sabedoria discerne o Espírito dominando em todas as formas de criação da mesma maneira que vê a substância, ou seja, o ouro, em todos os adornos feitos deste metal.

Apenas há um Ser realmente existente; é em Si mesmo Verdade e Consciência; a sua natureza é paz e pura Inteligência. É imaculado, omnipresente, em constante quietude, sem altos e baixos.

Sendo quietude e calma perfeita; não vê nada na existência; e as suas criações subsistem nesse repouso como partículas do Seu próprio esplendor.

Da mesma maneira que se vêem brilhar as estrelas na obscuridade da noite e emergirem as ondas na superfície das águas, assim todos estes fenómenos se manifestam na Sua realidade.

Tudo o que este Ser quiser ser, no acto se auto-concebe sendo-o; apenas esta Inteligência é a verdadeira Realidade, e todas as demais são reais apenas na medida em que as vemos sair d´Ela e voltar a Ela. Também nós temos surgido dessa Vontade divina: assim, em nenhum de nós há realidade nem irrealidade.

Essa Inteligência desperta chama-se mundo fenoménico e dormida e em calma o que denominamos salvação, libertação ou extinção do sofrimento.

Agora escuta, oh Rama, e te ensinarei a conhecer essa Verdade divina.

O homem de mente elevada observa o mundo como observaria uma folha de palha e repele as suas preocupações como se despoja uma serpente da sua pele.

Aquele cuja mente é iluminada pela maravilhosa luz da verdade do santo Yoga Adhyatma, encontra-se sempre debaixo da protecção das leis Espirituais da mesma forma que o Ovo do mundo está sempre protegido por Brahma.

Aproxima-te do Instrutor, oh Rama, com fé e veneração, e escuta todos os dias a Verdade sagrada que sai dos seus lábios, servindo-o com todas as tuas forças. Por ele receberás um dia a Verdade divina e serás livre.

Quem for conhecido pelas suas virtudes, tem o poder de governar o seu destino, de transformar os seus males em bens e de tornar duradoira a sua prosperidade. Quem está insatisfeito com o seu presente estado e deseja progredir, assim como aqueles que têm sede de conhecimento e buscam a Verdade, estes são chamados com toda a razão de seres humanos; todos os demais não são mais que brutos.

O renovado desejo de gozar do que se gozou e de voltar a ver o que já se viu, não é o meio de desembaraçar-se do mundo, senão a causa de numerosos nascimentos devidos a esses mesmos prazeres.

Que repercuta no mundo a grandeza das tuas virtudes, a tua renuncia, a excelência da tua conduta, o teu serviço desinteressado aos homens e a tua consagração a Deus na pessoa do Instrutor, porque daqueles cujas boas acções resplandecem como a luz da lua se diz que estão verdadeiramente vivos, enquanto que os demais, que não alcançam renome semelhante, estão mortos mesmo que vivam.

Os frutos da realização amadurecem seguindo com paciência os mandamentos dos Shastras, repetindo, sem pressa por alcançar o êxito, os mantras recebidos nas iniciações e aperfeiçoando-se através de uma larga prática.

Para que podem servir a riqueza, a beleza, a fama ou o poder sem um conhecimento da Verdade?

Consagra-te ao saber, portanto, e considera a riqueza como um dejecto sem valor. Eleva-te e aceita o remédio capaz de preservar-te da velhice e da morte: o conhecer que toda a riqueza e toda a prosperidade, todo prazer e todo gozo são prejudiciais se não estão consagrados ao bem dos demais; senão, o seu único efeito é entediar e debilitar o nosso organismo.

Agora, Rama-ji, está aqui a Verdade suprema.

Bem aventurados aqueles que a escutam e três vezes benditos aqueles que, da sua realização, fazem o único objectivo da sua vida.

Brahman é o intelecto.
Brahman é a mente.
Brahman é a inteligência.
É substância. É solidez.
É o principio de todas as coisas.
O universo inteiro é Brahman.
E, contudo, Ele transcende infinitamente tudo isto.
De facto, o mundo é nada, porque tudo é unicamente Brahman.
Para além da existência de Brahman, não há nada que possa comprovar-se como absolutamente certo, e a escritura declara: “Verdadeiramente, tudo é Brahman.”

Afasta-te do grandioso espectáculo deste mundo, que tão substancial é para a vista e tão absurdo para a experiência; é a guarida dos dragões do desejo lançando a venenosa espuma das suas paixões.

Tenta abandonar os teus desejos e evitarás todas as dificuldades; deixa de pensar em algo e o teu capricho por ele desaparecerá por si só. Inclusive pisar uma flor é acompanhado de um esforço, mas nenhum esforço é necessário para destruir o teu desejo, porque desaparecerá por si mesmo se não pensares nele.

Para colher uma flor tens que abrir a mão, mas para destruir os teus frágeis e enganosos desejos não tens que fazer nada.

Separando os teus pensamentos dos objectos e fixando-os em Brahman, serás capaz de realizar o que para os demais é impossível.

A total preocupação das nossas vidas é desejar e fazer, e em seguida, desejar de novo; no entanto, quando extirpa da mente toda a sua propensão inquieta, fica libertada de toda a ansiedade.

Abandona a tua louca confiança nos fenómenos visíveis, deixa tudo isso e permanece enraizado na consciência “Sou o Infinito”.

Antes de ter apagado da mente a ideia de que há coisas desejáveis e outras que não o são, é difícil encontrar a paz e a graça da serenidade, como é difícil à claridade da lua trespassar um céu nublado.

Os nossos desejos e as nossas aversões são como dois macacos que vivem na árvore do nosso coração; enquanto o agitarem e o sacudirem com as suas brincadeiras e sobressaltos, não pode haver repouso.”

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